Quando vi o blogue da Susana percebi logo que tinha de a incluir nesta rubrica de maternidade vegana. N'A Espuma dos Dias, ela aborda o veganismo de uma forma muito simples, directa e divertida: nele podem encontrar os planos semanais das refeições familiares, como é ter um bebé vegano e receitas sem crueldade.
Fã de Jane Austen, é mãe do Simão e adepta da alimentação variada. Deixou de comer animais na adolescência e já era vegana quando o Simão nasceu. Juntamente com o marido forma uma família compassiva e saudável, mostrando como os preconceitos à volta da alimentação vegetariana são totalmente infundados.
Fala um bocadinho de ti e do teu blogue.
Tenho 29 anos e sou de Lisboa. Gosto de ler, ver filmes e séries, tricot, cozinhar e montes de outras coisas que me ponham o cérebro e as mãos a aprender. O blogue começou mais para experimentar ter um blogue! Depois foi ficando, o Simão nasceu e comecei a partilhar coisas como fraldas de pano, alimentação vegetariana, o que ando a ler, etc.
Quando te tornaste vegana? Quais foram os motivos principais?
Tornei-me ovo-lacto-vegetariana com 16 anos, depois de ler a Libertação Animal de Peter Singer. A minha motivação principal era ética e já tinha tentado várias vezes, ao longo da adolescência, deixar de comer carne e peixe, mas a minha família entravava-me sempre o caminho. O veganismo veio gradualmente e sinceramente não sei bem dizer quando, porque podia passar meses sem tocar em nada de origem animal mas depois, por algum motivo, comia qualquer coisa com “soro de leite” ou assim do género nos ingredientes. Desde que o Simão nasceu temos (eu e o meu marido) muito mais cuidado com as listas de ingredientes e somos bastantes rígidos, de modo a não entrar absolutamente nada de origem animal na nossa alimentação. Actualmente, vejo o veganismo como a “cura” para vários males da humanidade: é um estilo de vida ético e sustentável ao contrário do consumo de carne e peixe, que está a causar poluição atmosférica, desflorestação, destruição de habitats terrestres e aquáticos e muito mais.
Que alimentos não dispensaste na gravidez e que consideras essenciais?
Nada de especial. Tomei um suplemento de ferro e ácido fólico (não o que me foi receitado, esse piorava imenso os enjoos), mas de resto comia normalmente quando conseguia. A verdade é que sofri de náuseas muito fortes e vomitava diariamente: cheguei ao fim do primeiro trimestre com menos peso do que no início! Portanto, comia o que conseguia. Lembro-me que o que me salvou foram nectarinas, broa de milho e doce de abóbora; não sei porquê, mas era o que conseguia comer. Tentava comer frutos secos gordos porque são ricos em imensos nutrientes e consumir muitos líquidos, não só para manter-me hidratada mas também para manter um bom nível de líquido amniótico. Para quem não está tão sensível e consegue comer de tudo, folhas verdes, líquidos, fruta fresca e gorduras saudáveis são excelentes opções nutricionais.
O que dirias às mulheres que têm uma alimentação vegetariana mas que têm receio em mantê-la durante a gravidez?
Não há motivo nenhum para preocupações. O ferro e o ácido fólico devem ser tidos em atenção, claro, mas isso é válido para todas a mulheres, vegetarianas ou não. Comam normalmente, de forma saudável e mantenham-se hidratadas. Se estiverem mesmo stressadas com nutrientes tomem um multivitamínico específico para grávidas, mais que não seja para se sentirem descansadas, o que só por si é essencial durante a gravidez. Acima de tudo, não tomem decisões com base em medo, isso corre sempre mal. Se têm dúvidas, tentem esclarecê-las com a médica, nutricionista, amigas que já tenham tido filhos, etc., mas tomem as decisões com confiança de que são perfeitamente capazes de fazer isto! Sobretudo, não deixem que vos metam medo com tudo o que podem ou não comer e usem o vosso bom senso. Eu comia saladas fora de casa, bebia chá (de café não gosto) e um copo de sidra ocasional. O pior inimigo da mulher grávida não é aquela refeição menos saudável mas sim o stress horrível que nos põem em cima de que, se sequer respirarmos um “alimento proibido”, o nosso bebé vai sofrer horrores.
Quais são as receitas preferidas do Simão? Que alimentos não faltam na sua alimentação?
O Simão tem 2 anos e meio e está numa fase manhosa. Na escola come sopa com verduras e leguminosas, sempre; em casa diz que não quer! Se forem douradinhos de espinafres ou croquetes de alheira [vegetal], parece que tem um buraco sem fundo e é capaz de comer mais que eu! Nós nunca forçamos comida: o jantar é servido e se ele quiser comer come, se não quiser não come (se quiser comer só uma parte, ou só a fruta, também não há problema). Como está bem de peso e tem um desenvolvimento óptimo, não nos preocupamos. Essencial mesmo é alimentos que sejam fortificados com cálcio e vitamina B12, como leites e iogurtes vegetais, que ele come sempre sem problemas. Tem também uma predilecção por alperces secos e bagas goji e, sempre que tem oportunidade, devora batatas fritas (fazemos na fritadeira de ar quente, sempre fica mais saudável). Queremos que ele tenha um alimentação saudável, mas não restringimos completamente bolos, doces, fritos, etc. Se for feito em casa (ou seja, se eu souber exactamente o que levou), em princípio ele pode comer. Acreditamos que saber equilibrar refeições saudáveis com guloseimas ocasionais é a chave para uma vida saudável a longo prazo.
Que produtos cruelty-free usaste durante a gravidez e usas para o Simão? Usaste algum produto na amamentação (por causa dos mamilos doridos) e para prevenir as estrias e a desidratação da pele?
Não usei nada nos mamilos durante a gravidez, tal como me foi aconselhado por um CAM. Nem sequer lavar com sabão directamente nas mamas, disse ele, para não desregular o pH e gordura natural da pele. E tinha toda a razão! Nunca tive problema nenhum nos mamilos durante a amamentação mas, se tivesse tido, teria seguido a outra recomendação dele, que foi, em caso de gretas, óleo de coco ou apenas esfregar com leite materno e deixar as mamas ao ar o máximo de tempo possível. Para a barriga usava manteiga de karité, que era um alívio na pele esticada. Não tive estrias, não sei se devido a isso ou se foi sorte.
O Simão usa, e sempre usou, os mesmo produtos de higiene que nós, seja sabão, champô ou hidratante. Somos muito minimalistas na quantidade de produtos e usamos mais óleo de coco, de amêndoas doces, sabão, etc. Geralmente compramos de marca branca, feitos na UE, e nunca tivemos nenhum problema, nem sequer assaduras. O único extra é óleo de amêndoas doces com calêndula e camomila, quando usava fralda. Sinceramente, acho que o negócio de “cosméticos infantis” é um bocado fraudulento e mais uma das milhentas situações em que os pais são emocionalmente chantageados para gastar dinheiro a bem da “saúde” das crianças, quando na verdade um sabão básico lava tudo e todos e é mais ecológico que embalagens e mais embalagens de produtos.
Criar crianças vegetarianas e saudáveis é mais do que possível, mas continua a ser encarado com desconfiança. Que materiais indicas para as pessoas mais cépticas?
Bom, basta olharem para as crianças vegetarianas que têm à frente. Os bons exemplos são o melhor “material”. No entanto, se for uma pessoa com vontade de se informar, posso indicar documentários (toda a gente gosta de ver filmes e têm duas horas livres) como o Forks Over Knifes. Gostei bastante do livro da Gabriela Oliveira Cozinha Vegetariana para Bebés e Crianças e emprestei-o à minha sogra, o que muito facilitou a aceitação de que o neto será vegetariano.
O veganismo não é só alimentação. Para ti, quais são os valores mais importantes do veganismo e que mais desejas transmitir ao Simão?
Curiosamente, não é preciso transmitir nada: os miúdos naturalmente não querem fazer mal aos animais. O que os pais omnívoros fazem é iniciá-los no processo de dissonância cognitiva, onde é mau fazer mal a um cão mas podemos matar um porco. Basta nutrir os sentimentos de empatia, que as crianças têm à partida, e ser um exemplo de respeito pelos animais e o Simão estará no bom caminho.
Muitos pais querem abraçar o veganismo, mas são pressionados a não o fazer. Que mensagem lhes queres deixar?
Depende de quem está a exercer a pressão e do contexto de cada família. Eu tenho um feitio que vai naturalmente contra quem me quer convencer a fazer coisas com as quais não concordo e, portanto, sou bem capaz de mandar as pessoas ir dar uma volta! Mas sei que há situações mais delicadas, principalmente se os pais não estão de acordo acerca de qual deve ser a alimentação dos filhos. Acho que devemos fazer aquilo que achamos estar certo, sem ceder a chantagens nem pressões, nem que seja de forma faseada para toda a gente à nossa volta se ir habituando. Se for uma médica a pressionar troquem de médica, porque essa é incompetente se não sabe que uma alimentação vegetariana é perfeitamente saudável. Se não tiverem possibilidade de trocar, usem as consultas para “provar” que estão todos perfeitamente saudáveis. A primeira médica do Simão ficou muito contrariada na primeira consulta por ele ser vegetariano (e ele ainda só mamava, mas ela já previa horrores no desenvolvimento da cria), mas a cada consulta ela ia lendo mais coisas e recolhendo mais informação e no fim (tivemo-la por ano e meio) já falava em comer cereais e leguminosas, quinoa, tofu, etc. ■
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